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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

CANAIS VERTICAIS


 

Os canais de distribuição eram tradicionalmente vistos, numa primeira fase como estruturas mercadológicas verticais, onde a responsabilidade ia sendo transferida de um segmento da cadeia de suprimento para a seguinte, como um bastão é passado numa corrida de revezamento. A Figura 4.3a mostra esse tipo de distribuição. O fabricante envia um caminhão carregado com seu produto (lotação completa) ao armazém do atacadista, onde a carga é desconsolidada. O atacadista vende o produto a diversos varejistas. O varejista estoca a mercadoria nas lojas, e a vende ao consumidor final. Serviços pós-venda (instalação, atendimento a reclamações, informações sobre uso etc.) são realizados diretamente pelo varejista quando solicitados pelos clientes finais.


Em termos logísticos, essa forma de estrutura do canal de distribuição se insere dentro da Fase 1, conforme discutido no Capítulo 2. Os estoques nos diversos segmentos do processo, conforme vimos, exerce a função de pulmão (buffer). Nesse tipo de estrutura vertical, os demais elementos da cadeia de suprimento, além do varejista, desempenham papéis de apoio, atuando nos bastidores do processo.

O atacadista desconsolida lotes completos, de vários fabricantes, e vende os produtos em pequenos lotes, aos varejistas. No entanto, o atacadista e o fabricante não têm acesso direto ao consumidor. É o varejista que interpreta as preferências do consumidor, as tendências da demanda, as necessidades de serviços pós-venda etc. Mesmo considerando outras formas de distribuição, como as representadas nas Figuras 4.3b e 4.3c, a satisfação das necessidades do cliente é sempre exercida, nesse tipo de distribuição, pelo último elemento da cadeia de suprimento, aquele que atende diretamente o consumidor.

Um consumidor que compra diretamente do varejista (Figura 4.3a) poderia ter preferido obter informações técnicas diretamente do fabricante, em razão, digamos, da maior sofisticação tecnológica do produto adquirido. Mas, na distribuição vertical, é o varejista o elemento encarregado dessa função. Muitas vezes, essa atribuição de fornecer informações técnicas aos consumidores, é deixada por conta dos vendedores das lojas. Esses, nem sempre conseguem absorvê-las na sua plenitude, em razão da crescente complexidade e variedade dos produtos. Como resultado, não conseguem transmitir o que lhes é solicitado pelos clientes, em muitos casos.
Essas restrições puderam ser contornadas com a revolução tecnológica e informacional da década de 1990. Basicamente, e como resultado desses avanços, a manufatura e a distribuição de produtos mudaram radicalmente naquela década. Partindo da Fase 1 da Logística, passando pelas fases intermediárias, atingimos finalmente a Fase 4, correspondente ao moderno Supply Chain Management, conforme discutido no Capítulo 2. Serviços sofisticados de distribuição de carga fracionada, como os da FedEx e UPS nos Estados Unidos, que se apóiam em sistemas de computação avançados, possibilitam às empresas despachar pedidos pequenos com prazos de entrega muito reduzidos. Com isso, os consumidores podem adquirir produtos diretamente dos fabricantes ou distribuidores, sem serem penalizados com prazos e burocracia excessivos. A manufatura flexível, por outro lado, permite aos fornecedores fabricar seus produtos em lotes bem menores do que antes, com custos quase iguais aos da produção em grandes lotes.
Os papéis de alguns intermediários na cadeia de suprimento, incluindo principalmente o atacadista e o distribuidor, estão sendo revistos. Em muitos tipos de comércio, a participação desses intermediários está ameaçada. Novas formas de canais diretos estão surgindo. Os canais indiretos, por sua vez, estão se tornando mais curtos (menor número de intermediários). Todas essas mudanças visam obter maior valor final para o consumidor, tirando partido das mudanças tecnológicas e de mercado observadas atualmente.
O que mudou efetivamente foi a forma de enfocar o problema da distribuição. Em lugar de resolver a questão procurando escolher os intermediários da cadeia de suprimento para se chegar ao consumidor final, agora se procede no sentido inverso. Parte-se do consumidor final, analisando-se suas necessidades e preferências, bem como as vantagens oferecidas a ele pela concorrência, e se vai atrás da melhor estrutura de distribuição que possa atendê-lo satisfatoriamente. Ou seja, parte-se do consumidor e não do fornecedor, e o foco da análise se concentra nas funções do canal de distribuição e não nos intermediários em si. A escolha do canal não é realizada ao fim do processo de planejamento da empresa, mas deve ser formulada como uma parte integrante de sua estratégia competitiva geral.

PROPRIEDADES DOS CANAIS DE DISTRIBUIÇÃO

EXTENSÃO E AMPLITUDE

A extensão (length) de um canal de distribuição está ligada ao número de níveis intermediários na cadeia de suprimento, desde a manufatura até o consumidor final. Cada patamar de intermediação na cadeia de suprimento forma um nível do canal. O chamado canal de nível zero (Kloter, 1993) não possui níveis intermediários, com o fabricante vendendo seu produto diretamente ao consumidor. É o caso da Avon, que comercializa seus produtos através de suas próprias vendedoras, de porta em porta. As empresas que vendem por meio de catálogo diretamente aos consumidores, são outro exemplo de canal de nível zero.
Os grandes varejistas, por seu lado, compram os produtos diretamente dos fabricantes e os revendem em suas lojas. Nesse caso tem-se um canal de um nível, uma vez que há apenas um intermediário na cadeia, o varejista. As grandes cadeias de supermercado constituem um exemplo típico de canal de um nível. Há casos com dois intermediários, formando canais de dois níveis. Por exemplo, os minimercados de vizinhança adquirem normalmente os produtos a partir de atacadistas que, por sua vez, os adquirem dos fabricantes. Podem ocorrer canais com mais níveis, embora sejam menos freqüentes.
A amplitude, também chamada largura do canal (width), definida para cada segmento intermediário da cadeia de suprimento, é representada pelo número de empresas que nela atuam. Três tipos de amplitude são normalmente observados na prática (Dolan, 1992):
Ø Distribuição exclusiva (amplitude unitária)
Ø Distribuição seletiva (amplitude múltipla, mas controlada)
Ø Distribuição intensiva (amplitude múltipla, aberta)
Na distribuição exclusiva, existe apenas uma empresa atuando em cada região demarcada pelo fabricante do produto. Isso pode ocorrer no nível de atacado, existindo um distribuidor ou atacadista autorizado para cada região. No nível do varejo, há somente uma firma varejista autorizada a vender o produto aos consumidores em cada distrito, conforme demarcação realizada pelo fabricante ou pelo distribuidor. Na distribuição seletiva existem mais do que uma firma atuando num mesmo mercado, mas de forma controlada. Ou seja, em lugar de designar apenas uma empresa para comercializar seus produtos, o fabricante seleciona algumas. O objetivo principal é aumentar as condições de acesso aos produtos e garantir certo nível de competição entre os comerciantes, distribuidores ou varejistas, conforme o caso. Na terceira alternativa, distribuição intensiva, o fabricante tenta colocar seu produto através do maior número possível de revendedores, não restringindo o número de participantes nas diversas regiões onde é comercializado o seu produto.
A escolha de uma das alternativas descritas acima depende essencialmente do tipo de produto. Três tipos básicos de produto são normalmente considerados (Bucklin, 1963):
Ø produtos de consumo freqüente;
Ø produtos que envolvem pesquisa antes da compra;
Ø produtos especiais.
O primeiro tipo é constituído pelos produtos que consumimos no dia-a-dia, como, por exemplo, xampu para o cabelo. A aquisição de um vidro de xampu é um evento rotineiro e pouco excitante. O consumidor, embora tenha alguma preferência por certa marca e certo tipo de produto, freqüentemente não hesita em comprar outra mercadoria com preço e qualidade semelhantes, quando não encontra sua primeira escolha no ponto-de-venda. Nesses casos, procura-se aumentar ao máximo a amplitude do canal, pois o volume comercializado está fortemente ligado à disponibilidade do produto nos pontos-de-venda. Esse tipo de produto está normalmente associado à distribuição intensiva.
Há produtos que somente são adquiridos após alguma pesquisa. Por exemplo, quando compramos um conjunto estofado para a sala de estar, alguns membros da família se envolvem no processo, analisando anúncios nos jornais, discutindo modelos e cores, e visitando algumas lojas do ramo antes de decidir pelo fechamento do negócio. Esse tipo de compra não é tão freqüente como no caso anterior, e envolve importâncias relativamente maiores. Para esse tipo de produto, não seria econômico para o fabricante ter a mercadoria disponível em qualquer loja, pois isso encareceria demais os custos de comercialização e de distribuição. Mas o produto deve ser exposto à venda em pontos acessíveis aos clientes potenciais, para pesquisa e avaliação. Como conseqüência, o fabricante normalmente seleciona certo número de revendedores, ou seja, escolhe uma distribuição seletiva.
Alguns tipos de produto, de alto valor e adquiridos esporadicamente, atraem o comprador pela marca, em razão de sua qualidade, do status a eles associados ou do caráter específico de seu desempenho. Por exemplo, certas pessoas desejam adquirir não um relógio de boa qualidade, mas um Rolex. Para esses tipos de produtos diferenciados, o comprador vai atrás do representante para adquiri-los. O fabricante prefere então escolher um único varejista em cada distrito ou região, concentrando as atenções sobre esse tipo de cliente através de um único representante (distribuição exclusiva). Nesses casos, é comum o comerciante ir ao escritório ou residência do comprador para mostrar o produto e vendê-lo.

ESTUDO DE CASO: A EMPRESA BOMFRIO

A Empresa
A fábrica BomFrio, pertencente a um grupo industrial de grande projeção nacional, está sendo instalada na região de Joinville, em Santa Catarina, e vai brevemente produzir aparelhos de ar-condicionado. A direção da empresa nomeou um grupo de analistas, envolvendo o gerente de marketing, dois representantes de vendas, um engenheiro do produto, e um especialista em logística, para definir e analisar os canais de distribuição do produto. O grupo de trabalho identificou preliminarmente dois segmentos homogêneos de clientes, a saber:
Ø clientes institucionais: órgãos do governo e grandes empresas, que adquirem lotes relativamente grandes do produto, por meio de licitações públicas ou pedidos de grande porte;
Ø consumidores formados por famílias ou pequenas empresas, que adquirem quantidades relativamente pequenas do produto (normalmente uma ou duas unidades), sem necessidade de licitação.
Inicialmente o grupo propõe o atendimento dos clientes do tipo 1 diretamente pelo setor de vendas do fabricante. Para isso seria criado um corpo de vendedores para atuar junto aos órgãos do governo e às grandes corporações, com o objetivo de conseguir contratos de fornecimento de aparelhos de ar-condicionado. Os consumidores de menor expressão, do tipo 2, seriam atendidos por lojas de varejo. Numa primeira análise, o gerente de marketing da indústria sugere que a melhor forma de distribuição para esse tipo de produto, por sua natureza e em função da atuação dos concorrentes, deveria ser uma distribuição seletiva. Assim, o grupo definirá o número de pontos-de-venda por região, dentro do território nacional, considerando população, renda per capita, e o possível market share em cada área. O gerente de marketing propõe também que a indústria abasteça diretamente os varejistas em todo o território nacional. Assim, haveria canal de nível zero para os clientes do tipo 1, e canal de um nível para o varejo.
O técnico de logística faz seus cálculos e mostra que o abastecimento direto a todos os varejistas dentro do território nacional exigiria muitos recursos, de um lado, e seria antieconômico, por outro lado; visto que o mercado básico da empresa estaria inicialmente localizado nas regiões Sul e Sudeste do país. Sugere, como alternativa, que a empresa selecione um distribuidor exclusivo por região, à exceção das regiões Sul e Sudeste em que os varejistas seriam abastecidos diretamente pelo fabricante. Esses distribuidores abasteceriam os varejistas de suas regiões e atuariam de forma exclusiva para a BomFrio, tendo direito a uma margem a ser definida posteriormente. Depois de discussões acaloradas, os membros do grupo concordam com a proposta do técnico de logística. Dessa forma, o varejo ficaria dividido, em termos geográficos, num canal de um nível, nas regiões Sul e Sudeste, e num canal de dois níveis, nas demais regiões do país. O homem de marketing faz a ressalva de que a empresa deverá encurtar os canais de dois níveis para um nível à medida que a região atendida for criando volume de demanda suficiente para justificar economicamente a mudança.
Um dos representantes de vendas diz que está preocupado com o atendimento às pequenas empresas. Argumenta que o grupo de vendedores da indústria BomFrio, que atende diretamente os clientes institucionais, não terão tempo nem disposição para atender as pequenas empresas. Sugere que se criem representantes regionais (dealers) que comercializariam o produto atuando diretamente junto às pequenas e médias empresas (sem lojas). Seria assim um outro canal de um nível. Na Figura 4.7 são apresentados, de forma esquemática, os quatro canais que foram propostos nas reuniões do grupo de trabalho. Assim, a etapa 1 para definição da estrutura de distribuição foi concluída, isto é, foram devidamente identificados os segmentos homogêneos de clientes devidamente agrupados em canais específicos.
A seguir, o grupo passou a analisar as funções associadas aos canais de distribuição. No que se refere às informações sobre o produto, foram levantados alguns aspectos importantes pelo gerente de marketing. Em primeiro lugar, o condicionador de ar BomFrio foi projetado de forma a produzir um ruído quase imperceptível mas, para garantir essa vantagem competitiva, o equipamento tem que ser montado sobre uma base especial. Como conseqüência, será necessário estudar uma forma de levar essa informação ao comprador pessoa física, como também aos clientes formados pelas pequenas empresas, que mostre claramente esse requisito, mas ao mesmo tempo não afugente o consumidor potencial, em razão do gasto extra com a instalação da base. Foi lembrado pelo especialista em logística que os dealers, voltados ao atendimento de pequenas empresas, poderiam facilmente oferecer o serviço de instalação da base. O mesmo não se poderia esperar dos varejistas, visto que tal atividade exigiria pessoal especializado, fora das funções normais do varejo.
No que se refere à variedade, além da fabricação em duas voltagens (110 e 220 volts), o gerente de marketing lembrou a necessidade de se ter pelo menos três capacidades de refrigeração diferentes, medidas em BTUs por hora. Todos concordaram. Mas um dos representantes de vendas argumentou que os aparelhos fabricados pelos concorrentes e instalados à beira-mar acabavam se oxidando em pouco tempo, prejudicando seu desempenho e sua estética. Sugeriu então que os aparelhos destinados às praças litorâneas deveriam sair da fábrica com um tratamento especial, para evitar a ferrugem. O engenheiro do produto ponderou que essa diversificação implicaria um processo adicional no chão de fábrica, envolvendo maior custo de produção, maiores estoques, maiores dificuldades na distribuição etc. O gerente de marketing sugeriu então que toda a linha do produto saísse da fábrica com o tratamento indicado. Isso eliminaria parte dos problemas levantados pelo engenheiro e traria uma vantagem competitiva extra para o novo produto.
Nesse momento todos perceberam que essa questão era um tanto complexa. Isso porque havia custos e benefícios a cotejar, como também era necessário o levantamento e a análise do que os concorrentes estavam planejando fazer nesse domínio (benchmarking). Ficou assim criado um subgrupo de trabalho, composto pelo engenheiro de produto, o especialista de logística e o gerente de marketing, para detalharem e analisarem a questão, devendo trazer depois os resultados para discussão em grupo.

REFERENCIAS:

Novaes, Antonio Galvão. - Logística e Gerenciamento da Cadeia de Distribuição: Estratégia, Operação e Avaliação – Ed. Campus, Rio de Janeiro, 2001.































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