CPRM Serviço Geológico do Brasil
LAUDO DE VISTORIA TÉCNICA DO PORTO CHIBATÃO – MANAUS (AM)
1. INTRODUÇÃO
Por solicitação do Ministério Público do Estado do Amazonas, pelo ofício nº611/2010/45PJEAT de 18 de outubro de 2010, foi realizada uma vistoria técnica no Porto Chibatão, orla do Rio Negro, na cidade de Manaus. O objetivo da vistoria foi avaliar a situação de risco provocada por deslizamento de terra ocorrido nos pátios de desembarque e estocagem de cargas e contêineres do porto (Figura 01).
Figura 01: Vista aérea do pátio ATR, mostrando o arco de ruptura. Na sequência, área afetada do pátio alfandegado, rampa de acesso e cais flutuante.
Uma equipe de geólogos da CPRM foi mobilizada para avaliar a situação e elaborar o presente laudo. Este trabalho teve início no dia 18 de outubro, com levantamento de dados de campo, obtenção de fotografias aéreas de baixa altitude, análise de mapas topográficos e imagens de satélite.
2. CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL
O porto do Chibatão localiza-se no sopé de uma escarpa erosiva, com cerca de 50 metros de altura, da orla do Rio Negro, em sua margem esquerda (Figura 02). Esta escarpa ou encosta é formada por camadas horizontais de arenitos, siltitos e argilitos da Formação Alter do Chão. Na base da encosta (próximo ao rio), ocorrem depósitos aluvionares recentes e inconsolidados (areia fina, lama e entulho).
Figura 02: Imagem de satélite do Porto Chibatão. Em vermelho, área do acidente.
Na área do Porto do Chibatão foram realizadas obras de corte e preenchimento para a construção dos pátios e vias de acesso. Em determinados locais a encosta foi escavada e em outros, vales de antigas drenagens foram preenchidos por aterro e nivelados. Obras de estabilização dos taludes e muros de contenção com estacas foram observados.
O pátio principal, assentado sobre material aterrado e solo natural, conhecido como ATR, possui área de aproximadamente 150 metros x 200 metros e constitui uma superfície praticamente plana, com suave inclinação para o rio. Próximo à margem do rio foi construído um muro de contenção, com cerca de 6 metros de altura. O muro de contenção é de concreto armado e foi “ancorado” com estacas de ferro espaçadas em 3 a 4 metros. O pátio principal possui, na porção central, uma caixa de drenagem de onde, aparentemente (a caixa está coberta por um contêiner), sai um tubo de cimento com cerca de 0,5m de diâmetro que prolonga-se, sob o terreno, em direção ao rio, e, que pode ser observado após a ruptura do aterro (Figura 03).
Figura 03: Superfície de ruptura mostrando o aterro e parte do sistema de drenagem (tubo de cimento indicado pela seta).
Outros pátios próximos ao local e que se encontram na mesma situação (aterro e muro de contenção) também sofreram deslizamentos, como o pátio alfandegado, ao lado do Porto Cajuí ou apresentam fissuras de tração, perpendiculares a inclinação da encosta, como no pátio de contêineres do porto flutuante (Figura 04).
Figura 04: Vista da área do acidente do pátio alfandegado. À direita, rampa de acesso da balsa de carretas.
3. O Acidente
O acidente ocorreu no domingo, dia 17 de outubro, por volta das 11h40min de um dia de tempo bom, sem registros de chuvas e o nível do rio Negro era de 14,71m, em plena vazante.
O acidente consistiu na ruptura de um talude artificial, mantido por um muro de contenção com cerca de 6 metros de altura que não suportou a carga e deslizou juntamente com o aterro, as cargas (carretas, contêineres e duas escavadeiras mecânicas) e os depósitos aluvionares situados na base do aterro. A ruptura ocorreu formando uma superfície semi-circular (ruptura rotacional) com cerca de 100 metros de raio. A profundidade da base do arco de ruptura não foi observada, visto que grande parte desta ocorre recoberta por entulho ou submersa. O mesmo processo de ruptura circular ocorreu no pátio alfandegado ao lado do Porto Cajuí, totalizando em torno de 500m de extensão.
Ressalta-se que trincas de tração surgiram na rampa de acesso ao porto da balsa de carretas, entendendo para o pátio de desembarque dos containers do cais flutuante. A trinca principal tem direção paralela a linha de costa do rio Negro, comprimento de 250m, e provocou um abatimento de 40 cm do terreno (Figura 05). Não foi possível avaliar a profundidade e espaçamento das trincas, pois elas haviam sido tapadas por concreto e asfalto.
Dois trabalhadores que operavam escavadeiras mecânicas na base do talude, depois do murro de contenção, foram soterrados.
Figura 05: Afundamento do piso do pátio de contêineres do cais flutuante ao longo trinca de tração.
4. Fatores condicionantes do acidente
- Aterro construído na base da encosta, sobre depósitos “inconsolidados” de areia, lama e entulho ocorrentes na margem do Rio Negro;
- O rápido rebaixamento do nível do rio e do lençol freático, por efeito da vazante, diminuíram o efeito do empuxo e da coesão do terreno (material do aterro e depósito aluvionar);
- A presença de fontes e vertentes d’água na base da encosta e dos aterros, podem indicar a ocorrência de erosão subterrânea retrogressiva (“piping”), levando a redução da resistência interna do maciço (Figura 06);
- O peso das carretas, contêineres e equipamentos gera uma sobrecarga sobre o talude artificial que pode causar a ruptura. O trabalho realizado pela escavadeira na base da encosta pode ter contribuído, ao gerar vibrações no terreno, na desestabilização do talude.
Figura 06: Imagem de satélite (Google, 2010) mostrando fontes e vertentes de água saindo da base dos aterros.
5. AVALIAÇÃO DE RISCO
Pelo porte dos deslizamentos de terra, volume de material envolvido, ruptura circular profunda e presença de extensas trincas de tração indicam uma instabilidade em todo o maciço, portanto:
- As áreas onde ocorreram os deslizamentos de terra, bem como aquelas situadas entre a principal trinca de tração e o rio Negro, são áreas de muito alto risco de sofrerem novos deslizamentos (Zona vermelha no Mapa I) – R4.
- As áreas constituídas por aterro, situadas acima das rupturas e da principal trinca de tração, são caracterizadas como de alto risco de sofrerem deslizamentos (Zona amarela no Mapa I) – R3.
- As áreas situadas no topo e meia encosta, sobre terreno natural, são consideradas de baixo risco de deslizamentos de terra - R1 a R2;
6. Conclusões e Recomendações:
- Recomenda-se a desocupação e suspensão das atividades em todas as áreas situadas abaixo das trincas de tração, caracterizadas como de muito alto risco e assinaladas em vermelho no Mapa I, até que estudos geotécnicos comprovem a estabilidade do talude;
- Recomenda-se não ocupar e não permitir a movimentação de cargas e pessoas a uma distância, a partir das trincas de tração em direção ao topo da encosta, igual ou superior a duas vezes a altura do desnível do terreno;
- Recomenda-se a realização de estudos geotécnicos, por empresas especializadas, para determinar a estabilidade dos taludes artificiais, aterros e da encosta natural.
Equipe executora:
Renê Luzardo
MSc. Geólogo, CREA/RS: 066118
Antonio Gilmar Honorato de Souza
MSc. Geólogo, CREA/AM: 12240-D